Ensaiando no Ateliê

Estreia essa semana no Teatro Sérgio Cardoso uma nova obra que irá integrar a edição 2013 do Ateliê de Coreógrafos Brasileiros, programa criado no ano passado pela São Paulo Companhia de Dança, e na última terça-feira (26/11) eu tive a honra de estar presente para acompanhar o ensaio dessa peça, que foi seguido de um bate-papo com Inês Bogéa, diretora da companhia, e a coreógrafa Ana Vitória Freire. Foi uma experiência maravilhosa que quero compartilhar com todos vocês!

Quando assisto uma apresentação eu procuro me envolver com a música para que ela me leve até a compreensão dos movimentos, e na sala de ensaio não seria diferente... No início há a presença de um instrumento cujo som lembra as ondas do mar, e no meio da cena um bailarino gira fazendo gestos para preparar o terreno para o que vem em seguida: soam os atabaques anunciando a entrada dos homens, com seus gestos fortes e vigorosos, se contrapondo com a delicadeza e suavidade dos movimentos das bailarinas, que aos poucos vão aparecendo, tomando forma, e ora ou outra interagem com os bailarinos. O berimbau parece que chama os bailarinos, eles formam uma roda, e é nesse momento que dança e capoeira se misturam, em perfeita sintonia!
Ensaio de "Vadiando"
Crédito: Marcela Benvegnu

Essa é apenas uma singela descrição do que pude apreciar dessa nova obra, que a coreógrafa Ana Vitória chamou de "Vadiando". Durante o bate-papo ela falou mais a fundo sobre a concepção desse espetáculo, cuja inspiração para a criação se deu através do filme "Vadiação" (1954), de Alexandre Robatto, o primeiro filme de dança que Ana assistiu ainda criança. Eu dei uma pesquisada e eu o encontrei para assistir completo, tem cerca de 08 minutos de duração:

Esse foi o ponto de partida para a criação da obra, que tem como intuito remontar o caminho feito pela capoeira, que tem origem na Angola e chegou ao nosso país através dos escravos. A coreógrafa mostrou esse filme para os bailarinos da SPCD e pediu a eles que cada um reconstruísse aqueles movimentos, cada um à sua maneira. A partir desse trabalho a coreografia foi se moldando, fazendo assim uma nova leitura do filme de Robatto, que segundo a filha do cineasta, era um desejo dele de que sua obra não ficasse engavetada, e sim fosse levada à público através de outros prismas e a mesma fosse de alguma forma preservada.
Ainda na parte coreográfica, a Ana nos contou também que quando estudou na UFBA ela tinha a capoeira na grade curricular, e chegou a ser reprovada nessa matéria. Ao receber o convite da SPCD para criar uma obra, ela fez questão que essa modalidade estivesse presente. Somado a isso, ela inseriu na movimentação dos bailarinos alguns gestos ritualísticos dos Orixás do Candomblé, entidades que estão diretamente ligados aos elementos da natureza.

Na parte musical, a primeira ideia era utilizar a trilha sonora do filme original, mas no decorrer do processo Ana optou que fosse criada uma coisa nova, e ao mesmo tempo, que contivesse a essência do trabalho que a inspirou. Para isso, o músico uruguaio Jorge Peña foi convidado para produzi-la especialmente para a coreografia.
O primeiro instrumento a tocar foi construído pelo próprio músico, e como já descrevi, seu som lembra as ondas do mar. A movimentação do bailarino que dança à princípio representa Exú, que segundo a tradição é o Orixá que abre os caminhos, tanto para que a capoeira chegue ao Brasil através do mar como para que o espetáculo possa acontecer... Simplesmente incrível! Logo em seguida entram em cena os atabaques e um berimbau desconstruído, pois nessa obra é tocado de maneiras inusitadas, como por exemplo, com um arco de violino.
Ensaio de "Vadiando"
Crédito: Marcela Benvegnu

Outro ponto abordado nesse bate-papo foi o programa do Ateliê como um todo. Conforme eu já contei para vocês na última matéria sobre SPCD, esse projeto visa ampliar a atuação dos profissionais da dança brasileira. A companhia sempre se preocupou com isso, e desde o início de sua existência convida esses coreógrafos para criarem para seus bailarinos. Porém no Ateliê quem dá o ponto de ponto de partida para a criação do espetáculo é o próprio coreógrafo, tendo total liberdade! Na obra encomendada, ele também é livre para criar, mas recebendo um briefing inicial que vai direciona-lo ao melhor caminho a ser seguido.

Diante de todo esse relato, só nos resta conferir a estreia dessa obra, que vai de 05/12 à 08/12. Os ingressos podem ser adquiridos na bilheteria do Teatro Sérgio Cardoso e no site ingressorápido.com.

Quero muito agradecer à São Paulo Companhia de Dança pela oportunidade!
Obrigada à todos pela companhia^^

Um grande abraço!

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